12/03/2009

Brasil ainda deve ao IDH

Brasil ainda deve ao IDH

A América Latina é uma das regiões com o maior índice de desigualdade social no mundo. E o Brasil, infelizmente, ocupa lugar de destaque, como pode ser observado no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) a cada ano.

Além do IDH, a representação do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) de cada país publica o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), que ajuda a levantar os problemas mais críticos para a qualidade de vida e o bem-estar da população mundial.

Esse tipo de relatório começou a ser feito em 1990. Dois anos depois, Camarões e Bangladesh foram os primeiros países a produzir o seu relatório nacional. O Brasil teve seu primeiro relatório nacional feito em 1996 e o mais recente em 2005, este com o tema central “Racismo, Pobreza e Violência”.

O Pnud Brasil prepara agora a confecção de um novo relatório para 2010, coincidentemente o ano em que o IDH completa 20 anos. “Até hoje o Brasil fez dois relatórios e um atlas. Agora teremos a oportunidade de produzir um relatório diferente, porque não se limitará a dados técnicos e estatísticos, mas começará com uma consulta à sociedade”, disse Flávio Comin, coordenador da campanha Brasil Ponto a Ponto. Entre as inovações estão a formulação de cadernos, o fato de ser escrito e distribuído para o grande público, a inclusão de uma análise crítica e propositiva de novas maneiras de medir o IDH e a viabilização do comprometimento pelos governos com ações práticas e mudanças concretas.

A campanha tem como principal objetivo escolher o tema do próximo relatório brasileiro por meio de uma consulta pública. “O que estamos propondo nunca foi feito antes: uma consulta aberta, ampla, por adesão e com uso de instrumentos diferenciados como a internet, para que toda a população possa participar”, disse Flávio. Ainda segundo o coordenador da campanha, só com a ajuda da opinião pública será possível descobrir fatos relevantes a serem levantados pelo relatório. “Normalmente os temas são escolhidos ou pelas coordenações regionais ou pelos governos, com resultados muito parecidos. É importante pensarmos em novas perspectivas”, afirmou.

Um segundo objetivo é a promoção da discussão pública sobre os grandes problemas nacionais dentro de uma perspectiva de desenvolvimento humano. Na opinião de Comin, apenas por meio da reflexão e da discussão é possível perceber o que é mais importante para a cidadania plena. “Às vezes, o que é importante para a vida de uma pessoa pode não ser tanto para outra, como a riqueza, por exemplo. O que queremos é explorar esse conceito de satisfação e autovalorização”, disse.

Os trabalhos começaram em novembro de 2008, quando foram ouvidas 2.500 pessoas em audiências públicas e visitas técnicas. “Nessas ocasiões, foram consultados órgãos de governo, organizações da sociedade civil para entender as demandas da população sobre problemas e sugestões de temas para o relatório. Foram realizadas audiências públicas em Belo Horizonte, São Paulo, Belém, Brasília, Porto Alegre, João Pessoa e Rio de Janeiro”, ressaltou o coordenador do projeto.

Além disso, durante mais de um mês o Pnud visitou os dez municípios brasileiros de menor IDH – Traipu (AL), Manari (PE), Guaribas (PI), Caraúbas do Piauí (PI), Araioses (MA) e Santana do Maranhão (MA) –, a fim de fazer uma leitura mais inclusiva dos problemas sociais. E ainda foram convidados a participar dessa consulta 4.000 cursos de pós-graduação em todo o Brasil. “O Portal dos Voluntários e o Pnud disponibilizaram em seu site uma enquete para que a população pudesse responder à consulta”, lembrou Flávio.

Consulta pública

A partir de agora e até o dia 15 de abril, qualquer pessoa pode dar sua resposta para a pergunta “O que precisa mudar no Brasil para a sua vida melhorar de verdade?”. É só acessar a página http://www.brasilpontoaponto.org.br/ e postar sua opinião, escrita ou gravada em vídeo. “Por meio dessas contribuições, estaremos construindo um relatório a partir dos brasileiros, dos indivíduos, das pessoas”, declarou Comin. Sua equipe espera contar com mais de 1 milhão de participações até o final da pesquisa.

De acordo com ele, com a ajuda de parceiros serão abertos outros canais para que as pessoas possam expressar sua opinião. “Sabemos que muitos ainda não têm acesso à internet. Então firmamos parceria com uma empresa de telefonia celular para que o participante possa enviar um SMS com sua resposta. Além disso, contamos com outras formas de apoio, como o de uma empresa de cosméticos que fará a pesquisa entre suas mais de 750 mil consultoras e seus clientes”, disse.

Outro parceiro importante, segundo Comin, é o Conselho Nacional de Educação (Consed), que levará a pesquisa para as escolas públicas de 18 Estados brasileiros. “Com isso atingiremos 1 milhão de alunos. Se metade desse contingente responder, já será um grande passo.”

É importante destacar que a pesquisa e o relatório não fazem parte da formulação do IDH mundial, que se utiliza de fórmulas matemáticas e conceitos declaradamente ultrapassados para definir o bem-estar de uma população. “Hoje, o IDH compara três dimensões que são o conhecimento, a saúde e o padrão de vida. As formas de se contabilizar essas informações há muito tempo vêm sendo questionadas. Mas não é nossa intenção reformular esses padrões, até porque é um relatório regionalizado. É claro que com o levantamento dos resultados surgirão informações que poderão transformar-se em propostas que ajudarão a melhorar a coleta de dados e a obtenção de resultados. Mas não é essa a intenção principal da campanha”, alertou Comin.

Para ele, é cada vez mais evidente que as pessoas aspiram a mais do que dinheiro para ter melhor qualidade de vida. “Nos primeiros resultados, observamos que têm sido muito valorizados pela população itens como melhor qualidade da educação e a formação de valores por meio dela, solidariedade e respeito ao próximo e implementação de políticas públicas de inclusão. Essa nova metodologia implantada pela equipe da campanha quer mostrar aos brasileiros que sua opinião conta e que a riqueza de um país está na sua gente”, finalizou.

Por Fabrício Ângelo (Envolverde), de Brasília. Edição de Benjamin S. Gonçalves