Advocacy alavanca a abrangência de intervenções sociais
3/12/2008 – David Devlin-Foltz foi um dos palestrantes do Módulo 5 do curso Foundation School, que discutiu a avaliação de resultados e impacto de projetos de investimento social privado. Diretor da Global Interdependence Initiative (GII), Devlin-Foltz trabalha com grupos de fundações e institutos que atuam por meio de advocacy, isto é, fazendo o acompanhamento da atuação do poder público, conscientizando a sociedade e mobilizando a população em torno de uma causa. O GII é o braço do Aspen Institute em Washington que atua a favor do estabelecimento de políticas conjuntas em assuntos globais como aquecimento do planeta e o combate à AIDS.
O Continuous Progress Strategic Services (CPSS) é uma das atrações do GII. Por meio dele, organizações sem fins lucrativos como o Connect US Funding (mantida pela Ford Foundation, a Hewlett Foundation, a Charles Stewart Mott Foundation, o Rockefeller Brothers Fund e o Open Society Institute) conseguem criar planos de ação e avaliar seus esforços para influenciar a política externa norte-americana. Eles utilizam o Composite Logic Model, uma ferramenta criada para o planejamento e análise de campanhas em benefício de causas específicas. Uma versão mais simples, o Advocacy Progress Planner está disponível na internet para que investidores possam pensar, passo a passo, sobre objetivos, impactos, públicos-alvos, ações específicas e benchmarks em advocacy.
Com mais de 20 anos de experiência trabalhando em organizações como a Carnegie Corporation e o Institute of International Education, Foltz falou ao portal do IDIS sobre os benefícios de políticas de advocacy e estratégias de avaliação. Confira os principais trechos.
IDIS - Como bons projetos de advocacy são construídos?David Devlin-Foltz – Com planejamento. Bom planejamento em advocacy significa reconhecer que o processo contém um paradoxo: ele quase nunca sai como planejado. Por quê? Porque muito do processo político e de elaboração de políticas públicas está além do controle ou da habilidade de previsão do responsável. Afinal, tudo que vale a pena ser feito, vale a pena ser planejado com cuidado. Isso é uma verdade para empreendimentos lucrativos, projetos de desenvolvimento de serviços e esforços em prol de causas.
IDIS – Mas se os esforços em advocacy nunca saem como pensado, qual é o valor do planejamento?Foltz - O valor está na tentativa de ser o mais explícito possível no conceito de como o processo deveria ocorrer. Esse planejamento permite que as instituições responsáveis pelas ações (e os financiadores) identifiquem quais suposições estavam erradas quando o projeto seguir por outro caminho. Além disso, a minha segunda maior dica é: escolha o menor público-alvo possível para o seu trabalho em advocacy. Isso permite utilizar recursos escassos até o limite. Nós recomendamos aos nossos clientes: não tentem alcançar o público em geral. Tente alcançar apenas aqueles que de fato vão realizar aquilo que vocês desejam que aconteça.
IDIS - Em sua opinião, qual é a importância da prática no investimento social privado?Foltz – O advocacy pode alavancar a abrangência da fundação para muito além do que seria alcançado por meio do mero financiamento ou da prestação de serviços. Até mesmo Bill Gates afirmou que seus bilhões em filantropia nunca seriam suficientes para lidar com os enormes desafios em saúde pública que ele estabeleceu. Ele reconhece a necessidade de advogar a favor de mais financiamento de fontes nacionais e internacionais.
IDIS – Os processos de advocacy impõem um obstáculo considerável: a avaliação. Como uma instituição pode identificar progressos em sua teoria da mudança sem se ater apenas a dados quantitativos?Foltz - Isso é sem dúvida difícil. Mas é possível, na maioria dos casos, ao menos demonstrar se uma organização contribuiu para a mudança desejada. Se nós não tentarmos resolver essa questão, é possível que continuemos a medir os produtos sem nunca demonstrar que essa atividade faz uma diferença significativa.
IDIS – Qual a diferença entre avaliar a oferta de serviços e avaliar advocacy?Foltz - A avaliação de serviços geralmente apresenta produtos e resultados claros, que permitem a comparação entre projetos com diferentes abordagens. Políticas de advocacy dificilmente admitem essa oportunidade: é essencialmente um experimento que envolve interações complexas entre pessoas, suas políticas e o contexto econômico. É raro identificar com precisão o que causa mudanças em políticas e comportamentos de pessoas no poder.
IDIS - Você pode dar exemplos de processos bem-sucedidos de avaliação ou boas estratégias para a mudança social?Foltz – No Aspen Institute, nós estamos satisfeitos com a avaliação de esforços de advocacy em 20 projetos que buscam influenciar a política externa norte-americana no próximo governo. Todas essas iniciativas tentaram, usando várias estratégias e táticas, garantir que candidatos para a presidência e o congresso discutissem questões específicas. Muitos reconheceram que nosso trabalho ajudou a planejar suas ações com mais cuidado e a ajustar suas ações com o desenrolar do projeto. Mais amplamente, sem dúvida, há muitos exemplos mudanças sociais profundas: as reduções de motoristas alcoolizados e o uso de cigarro ou o aumento na utilização de cinto de segurança são exemplos clássicos. Essas campanhas utilizaram estratégias de comunicação massivas ao mesmo tempo em que realizaram políticas de lobby e de demandas judiciais. E as mudanças vieram, como as que nós esperamos nos próximos 4 anos.
IDIS - Como planejar a mudança social?Foltz - Mudança social é um processo extremamente complexo. Como primeiro passo, eu estimulo os investidores a analisar onde estão hoje e onde eles desejam ir – ou seja, mapear o estado atual do problema e realizar um inventário de ativos. Isso é senso comum, mas nós descobrimos que muitas instituições ignoram esse cuidado por desejar colocar a mão na massa o mais rápido possível. Além disso, sem planejamento é possível se perder antes de atingir aquele objetivo de longo prazo que implica em mudança social. O mapeamento consiste em um planejamento cuidadoso que pode ajudar a antecipar rotas alternativas. Isso pode ajudar o agente da mudança – a fundação e seus parceiros – a responder com rapidez a obstáculos.
IDIS - A avaliação é parte do processo de prestar contas ao público?Foltz - Avaliação em qualquer esforço de investimento social privado é uma parte crítica de prestar contas ao público. Nosso trabalho agora tem como objetivo ajudar doadores e mobilizadores de recursos a ser leal com o público. A transparência financeira é uma das etapas desse processo e é fruto de sistemas de controle que deveriam nascer naturalmente em instituições de investimento social privado. Afinal, a maioria daqueles que fizeram grandes fortunas sabe como manter contas claras e transparentes. O próximo passo é dividir esse status com o público via relatórios e informes acessíveis.
IDIS - Baseado na sua experiência na Carnegie Corporation e no Aspen Institute, quais são as diferenças entre instituições novas e tradicionais?Foltz - A Fundação Carnegie foi e continua sendo uma instituição muito tradicional e uma das mais antigas dos Estados Unidos. O próprio nome corporação, escolhido por Carnegie, mostra o tamanho das iniciativas realizadas por uma equipe profissional e que tem autonomia em relação a um conselho independente. Suas contribuições foram marcantes, como pesquisas sobre questões raciais ou a importância da educação na primeira infância. Mais recentemente, eu trabalhei com instituições mais novas. Algumas que estavam lutando para definir um novo modelo para a filantropia, especialmente uma que misture soluções baseadas em prerrogativas do mercado com elementos tradicionais da filantropia. Esse é um novo campo, tanto a partir de uma perspectiva legal quanto programática, com o maior envolvimento de fundadores e financiadores.
IDIS - Como fundações tradicionais podem se modernizar com responsabilidade?Foltz - No contexto norte-americano, modernizar-se significa adotar formas híbridas de investimento social privado. Ou seja, a reorganização de uma fundação para se tornar uma instituição que desenvolve projetos ao invés de ser apenas doadora. Também é possível explorar abordagens baseadas no mercado. São algumas mudanças que requerem alterações na escritura e no status legal da instituição e que podem ser bem complicadas. Eu saúdo a criatividade e a energia que essas novas abordagens podem trazer, mas criatividade é, por definição, um caminho arriscado. É preciso evitar um desfecho comum: quando os beneficiários das ações pagam as contas de processos criativos que deram errado.