15/08/2009

Pesquisa avaliará serviços de assistência a usuário de álcool e drogas

Pesquisa avaliará serviços de assistência a usuário de álcool e drogas
ENSP, publicada em 13/08/2009

Avaliar serviços públicos da cidade do Rio de Janeiro que prestam atenção básica a usuários de álcool e drogas é o objetivo da pesquisadora Lucília de Almeida Elias, do Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria (CSEGSF/ENSP). Em seu projeto de doutorado em Saúde Pública na ENSP, intitulado "Assistência pública a pessoas que consomem álcool e drogas de modo prejudicial", a pesquisadora lança novos olhares ao tema do uso de drogas e às formas de avaliação do tratamento para o usuário. Iniciada em 2007, a coleta de dados termina em meados de 2010.

Há mais de 15 anos trabalhando na assistência a usuários de drogas e álcool, Lucília enfatiza que eles são um grupo de acesso muito difícil. Segundo ela, a criminalização dos usuários é um obstáculo para quem deseja buscar ajuda médica. Para reverter esse quadro, a pesquisadora sugere que os serviços públicos de assistência aos dependentes devem facilitar o acesso e promover um bom acolhimento aos pacientes. "É preciso ver que o usuário de drogas também é um cidadão, com direito à assistência à saúde", enfatizou a pesquisadora.

De acordo com Lucília, a resistência dos pacientes em reconhecer sua condição e buscar tratamento torna a questão do uso de drogas lícitas e ilícitas mais delicada. "A saúde mental já é um campo difícil, justamente pelo fato da aceitação do problema. Por isso, é preciso que o serviço de saúde pública esteja preparado para o acolhimento", explicou.

Redução de danos é a melhor saída para pensar saúde de pacientes

Pensar o uso de drogas lícitas ou ilícitas não pode passar pela perspectiva de abstinência total, de acordo com a pesquisadora. Para Lucília, uma metodologia que vise à redução de danos é muito mais adequada à realidade dos usuários. "Ainda que a pessoa tente, sabemos que, de forma individual, o processo de abstinência total é muito difícil. Coletivamente, a esperança da abstinência total é impraticável, principalmente se olharmos a história das civilizações. As drogas são usadas há séculos. Portanto, reduzir os danos se torna uma meta mais realista para aquelas pessoas que não conseguem parar ou que não querem parar totalmente", afirmou a pesquisadora.

Lucília destaca que os serviços de saúde pública com foco no tratamento de dependentes de drogas devem levar em conta a subjetividade dos pacientes. Para isso, é fundamental fazer o acompanhamento caso a caso a partir das demandas do próprio paciente. "A melhor forma de conciliar as diferentes visões dentro do serviço é estimular o viés prático e multidisciplinar da saúde pública, além do diálogo entre os profissionais de diferentes áreas que estudam o tema. O serviço precisa ser organizado em suas diretrizes básicas, mas também flexível o suficiente para se adaptar às diferentes realidades. O usuário de drogas não tem perfil definido. Para o tratamento, esse fator deve ser considerado", indicou Lucília.

Na opinião da pesquisadora, a perspectiva de redução de danos é também a arma contra a frustração, a qual os profissionais podem vir a enfrentar em seu trabalho. Segundo dados da OMS, 30% dos pacientes com algum tipo de vício conseguem se recuperar. "A partir da redução de danos, é possível pensar que toda redução do uso de drogas e os riscos que elas causam ao paciente é um ganho. Ainda que ele não fique abstêmio, já é um passo muito importante", salientou a pesquisadora.

Integrar o usuário, a família e a comunidade faz parte do trabalho

A pesquisadora do Centro de Saúde aponta que, geralmente, a família do usuário de álcool ou drogas sofre tanto ou mais que o próprio paciente. Muitas vezes, é a família que o encaminha ao atendimento especializado. Outras, o paciente procura ajuda por problemas relacionados ao uso de drogas - como problemas estomacais, dores de cabeça ou depressão. "É importante que a família participe, opine e traga suas demandas junto com a comunidade. Ela deve estar presente não só durante o tratamento, mas também na elaboração da metodologia de trabalho", afirmou Lucília, que citou a eficiência da estratégia do programa de Saúde da Família do CSEGSF.

Outro ponto frisado pela pesquisadora é a percepção do envolvimento do usuário com seu entorno social. Muitos deles adquirem doenças infecciosas, como Aids ou hepatites B e C, e acabam contaminando outros moradores da comunidade por meio de relações sexuais ou do uso compartilhado de seringas para drogas injetáveis. Por isso, o trabalho não pode ser focado apenas no usuário, mas também nas condições da região onde ele vive. "Uma dificuldade desse tema é a dinâmica das drogas. Esse panorama está a todo tempo mudando. Em um momento, por exemplo, pode ser que o crack esteja sendo mais consumido que outras drogas. Por isso, os mais indicados para apontar os problemas de uma região são os seus próprios moradores." esclareceu.

Trazer a discussão para a pauta da sociedade é outra necessidade identificada pela pesquisadora a fim de alcançar melhoria nos serviços de atenção básica. Ela cita casos de países como Holanda e Escócia, onde medidas de esclarecimento e prevenção foram tomadas por órgãos do governo e pelos usuários. Entre os anos de 1982 e 1984, em Edimburgo, na Escócia, os usuários de drogas injetáveis entraram em acordo com os donos de farmácias para o fornecimento de seringas descartáveis para evitar o risco de contaminar outras pessoas. "É preciso aliar a assistência pública às políticas relativas ao consumo de drogas ilícitas e do álcool. Debater as demandas da sociedade sobre a legislação, informar sobre os riscos à saúde - seja a do próprio indivíduo ou a da comunidade. Enfim, debater a questão de modo mais abrangente para poder avançar no tema", finalizou Lucília.

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